Pacheco Pereira (e não José Pacheco Pereira – vide Em NOME da Diferença)
é actualmente o comentador político da minha predilecção. Poderia dizer que o é
devido à isenção e independência que revela nesse mesmo comentário, à cultura e
inteligência que demonstra na leitura da actualidade política ou a sagacidade
que evidencia nas análises por si efectuadas…Poderia dizer tudo isso e seria
verdade mas o motivo verdadeiro para tal preferência enraíza-se no facto de o
que diz encontrar ressonância naquilo que também eu penso e sinto e em última análise,
por muita abertura intelectual que possamos pensar que temos, acabamos sempre
por seguir, acompanhar e gostar de quem exterioriza aquilo que também já nós somos
e pensamos interiormente, sejam comentadores políticos escritores músicos cineastas.
Seve este prelúdio para introduzir o texto publicado por
Pacheco Pereira no PÚBLICO a 04 de Junho (vide A máquina da ignorância ao serviço da política que não ousa dizer o nome); neste, o autor do
mesmo insurge-se contra este facilitismo contemporâneo de qualquer um poder
exercitar o seu direito de opinião de forma prepotente e até arrogante, sem
qualquer pudor intelectual, e com pretensões de influenciar e contaminar as
opiniões que em torno desses despejos gástricos possam gravitar que nem moscas
esvoaçando sobre merda. Podendo eu mesmo incluir-me no grupo dos visados por
Pacheco Pereira, afinal também eu escrevo neste vosso blogue a minha opinião
leiga sem ser um académico de créditos firmados nem um conhecedor de facto com
experiência nos corredores da política, a verdade é que não podia concordar
mais com o exposto. Julgo sinceramente que um dos maiores problemas da nossa
sociedade contemporânea emana desta assunção automática não discutida e não
sancionada de que todas as opiniões têm valor e devem ser ouvidas e respeitadas.
Pacheco Pereira parte desta premissa para depois ensaiar uma crítica à idiotice
e estupidez do cartaz publicado pela JSD em que compara Mário Nogueira (o sindicalista
da FENPROF) a Estaline, mas a premissa lançada nessa análise tem, na minha
opinião, ramificações muito mais profundas e merecedoras de discussão que a
mera publicação de cartazes idiotas e de mau gosto e é sobre essas ramificações
que pretendo incidir o presente texto.
Referi no parágrafo anterior que “um dos maiores problemas
da nossa sociedade contemporânea emana desta assunção automática não discutida
e não sancionada de que todas as opiniões têm valor e devem ser ouvidas e
respeitadas”…Numa primeira leitura, tal afirmação cai mal e pode até ser
interpretada como uma arrogante e elitista manifestação de censura associada e
ideologias ditatoriais. Desenganem-se, não o é. Jamais defenderia a restrição
do direito à opinião de quem quer que seja! Mas peço agora que acompanhem o
seguinte raciocínio… Pacheco Pereira critica a ignorância associada à
facilidade contemporânea desta ser publicada e reproduzida em cartazes
idióticos ou textos nas redes sociais de igual teor de idiotice mas essa
manifestação de ignorância é a que menos me preocupa, pois só lê esses textos e
só dá importância a esses cartazes quem quer; eu, por exemplo jamais visitaria
qualquer site ou blog “sponsorizado” pela JSD, ou qualquer outra Juventude
Partidária para o efeito, pelo que essa ignorância e estupidez, mesmo com todas
as facilidades de propagação actualmente ao seu serviço, não me afectam minimamente.
Já por outro lado, quando
penso que essa mesma ignorância e estupidez têm livre
acesso ao voto democrático e quando constato que a idiotice delas resultante não
se esgota em cartazes e publicações que possa evitar mas estende-se à escolha
de decisores políticos cujas ideias, ideais, princípios e actuação impactam directamente
na minha vida, estremeço! E é nesse estremecer que julgo ser justo questionar a
valoração do direito à opinião de todos e qualquer um; quando o meio de
comunicação escrito mais vendido e difundido em Portugal é o “Correio da Manhã”
e o quando o meio audiovisual de informação favorito dos portugueses era o
Jornal Nacional de Manuela Moura Guedes, conclui-se que a opinião cujo direito
de exercício parece não se poder questionar é construída a partir de fazedores
de opinião medíocres e de uma miserabilidade intelectual que quando posta ao
serviço da democracia por via do voto popular desagua numa escolha deturpada
pela ignorância dos condutores da nossa política nacional, culminando tal numa democracia
da ignorância, que á a actual em que vivemos. Por isso sim, julgo ser não só
justo mas mesmo imperativo questionar e discutir esta assunção automática de
que todas as pessoas têm direito á opinião e que todas as opiniões têm o mesmo
valor.
Discutindo então “ esta assunção automática de que todas as
pessoas têm direito á opinião e que todas as opiniões têm o mesmo valor”, posso
dizer que concordo com a primeira parte da frase, a de que todas as pessoas têm
direito à opinião mas discordo da segunda, a de que todas as opiniões têm o
mesmo valor; por exemplo, a minha opinião política é infinitamente de menor
valor do que a de Pacheco Pereira, se atentarmos que a opinião do primeiro é
formada e construída com o que lê e vê (leiga portanto) enquanto que a do
segundo brota de um conhecimento académico testado e reconhecido e de um
conhecimento de facto derivado da experiência directa sobre o tema me que se
debruça. Assim, e tal como havia referido não defendo que deva haver qualquer
restrição ao direito de opinião e ao seu exercício, como é por exemplo advogado
nas teorias sociais “Elite Theory” e “Angels Theory”, mas reconheço que as
opiniões não têm todas o mesmo valor e, atendendo à miserabilidade da opinião
de grande parte, dever-se-á actuar com vista à elevação valorativa da opinião
generalizada, o que apenas pode ser conseguido por via da Educação. Apenas
através de um processo educativo que passe a incluir componentes cívicas e de
consciencialização social e humanística poderemos passar desta Democracia de
Ignorância para uma Democracia de Conhecimento.
Para ilustrar a identificação com Pacheco Pereira preludiada
e que está na génese deste texto, cometerei a arrogância e o pedantismo de me
auto citar:
“O pior das pessoas
É que todas têm opinião
E o pior da sociedade
É que todas as opiniões têm valor
E o valor das opiniões
É cego
Surdo
E o valor das opiniões não se justifica
O predicado nasce aquando do sujeito
Garante-se a si mesmo sem qualquer mérito
E as pessoas tornam-se arrogantes
Porque as suas opiniões têm valor
Apesar de não o terem
As pessoas ganham coragem
E verbalizam as suas opiniões
As pessoas arrogantes convencem-se das suas opiniões
E quando as pessoas se convencem
Apesar da miserabilidade que as acompanha
Das suas opiniões
O mundo torna-se um sítio pior.”
(Sandro Morgado, em “O Prelúdio do Eu Social”, 26-04-2014)
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